sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Privacidade

Desde criança que tenho a sensação que não há forma de viver a vida sem que outros estejam a a par daquilo que fazes. Falo de privacidade. Em miúda li algures que os satélites enviados para o espaço podiam ler um papel minúsculo caído no passeio com perfeita nitidez. Também li que existiam armas militares capazes de ver as pessoas através das paredes e que, inclusive, já tinham sido usadas para apanhar as pessoas no acto sexual. Nunca gostei de fazer algo privado, como sair da banheira e entrar no quarto, se uns cortinados não estivessem a tapar a janela. Sentia mesmo que mais alguém estava a espreitar. Se escrevo ao computador algo privado, como um diário ou um blogue e a janela estiver sem cortinas, mesmo sabendo que estou num andar alto e o prédio em frente está longe, sempre acho que alguém tem formas de espreitar. Binóculos, telescópio... Com o tempo, fui tentando não me importar com o facto de estar a escrever no computador, por exemplo, e saber que alguém no prédio em frente pode estar a invadir as minhas ideias recorrendo a um destes utensílios de espionagem.


Mas desde o início que não vivo em função desta impressão que tenho. Não é uma mania nem uma paranóia. É algo consciente, apenas isso. Hoje foi reavivada, quando um colega de trabalho aproximou-se para me dizer que sabia qual era a password do meu email. Disse-me que a descobriu num dia em que deixei o email aberto no computador e me ausentei. Ainda me disse que cada vez que acedia à conta, em qualquer parte do mundo, ele sabia-o.




Não sei porquê me disse ele isto. Talvez para me intimidar, desesperar, sei lá. A verdade é que isso me fez pensar no quanto me esforcei, me obriguei a mudar um certo hábito. É que, no emprego, nunca me apetecia consultar os (muitos) emails que tenho. Era sempre uma coisa que fazia depois do expediente, quando chegava a casa. Lá só tinha energia para me ocupar com as tarefas necessárias e, quando dava conta, estava a consultar o meu emails horas depois, em casa, durante umas horas... No entanto sei que os meus colegas, à semelhança da grande maioria das pessoas, aproveita para consultar os emails pessoais no trabalho. Eu me interrogava porquê não tinha eu a mínima inclinação para o fazer também. Ás tantas, comecei a forçar o gesto. Tive mesmo de me obrigar! Comecei por consultar aqueles que menos informações sobre mim podiam facultar. Os abertos para responder a um site duvidoso, para tratar de um assunto específico, etc... depois comecei a abri-los todos. O único que nunca quis abrir foi este, que me dá acesso a este blogue. Mas já não me recordo se, por uma única vez, me senti tentada e experimentei.

Já não é a primeira vez na minha vida que me forço a adquirir um mau hábito, só porque não entendo como posso não partilhar esse fascínio como a maioria das pessoas.
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Em criança nunca fui de experimentar estas teorias aplicadas aos cigarros, drogas, álcool e outras coisas semelhantes. O facto da maioria beber, fumar, drogar-se, andar na rua, maquilhar-se, embonecar-se, etc, nunca me fez querer experimentar. Nunca! Sempre vivi muito bem na minha pele, a pesar de ser um ser frágil e volátil. Sou mais por este tipo de desafio espiritual... porquê não consulto/envio eu emails pessoais no emprego? E como será resistir a uma coisa que me apetece muito? - é este tipo de "desafios" que acabo por agarrar.
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Vivemos numa sociedade informatizada onde tudo está exposto e qualquer pessoa tem acesso aos teus dados pessoais. Juntando uma má indole, o resultado pode mesmo ser algo equivalente à morte.

2 comentários:

  1. Compreendo a tua apreensão, mas acho que te martirizas em excesso. É claro que eu não quero ninguém a espionar-me, mas também não me preocupo muito com isso. Se começares a ter medo de viver, começas a ter poucos motivos que justifiquem essa mesma vida. Beijoca!

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