terça-feira, 24 de setembro de 2013

Um jardim povoado é um jardim abençoado!

Perto de mim existe um jardim ao qual sempre gostei de ir. 
Há uns anos chegou a ser meio perigoso andar por lá. Não se via viva alma, era mais um local que era atravessado para se ir do lugar A para o lugar B. O relvado abandonado a palha no verão, verdejante mas com dois metros de altura no inverno, sujidade por todo o lado com folhas secas a amontoarem-se em respeitáveis pilhas e lixo por todo o lado. Parecia mais frequentado por pessoas de índole duvidosa. Uns tantos já tocados pela bebida que ali deixavam garrafas e garrafas vazias, outros com aparência suspeita, que andavam de um lado para o outro, sem fazer nada em particular, como que atentos a quem passava a ver se tinham sorte. Gostava de ir para o jardim mas nesta altura passei a ter mais cuidado e a certas horas acabava por não lá ficar.


Depois veio a crise. E as coisas mudaram. Aos poucos, mudaram. Começaram a cuidar do relvado, do arvoredo e a tratar do lixo circundante. Logo depois surgiu a ciclovia e julgo que deve ter sido por causa deste projecto que o espaço ressuscitou e lhe devolveram alguma dignidade. 


Subitamente o lugar ganhou mais vida por se encher de pessoas. Tornou-se mais seguro frequentar o jardim. Timidamente as gentes foram aderindo aos prazeres do ar livre. O vento nas árvores, as folhas e seus assobios, os cantos das aves...  Era ver as crianças a brincar ali todos os dias, com os pais, os idosos sentados nos bancos, a conversar e os desportistas a fazer jogging. Dava gosto após um stressante dia de trabalho passar pelo jardim e descontrair. As crianças ou adolescentes a jogar futebol na relva, a jogar raquetes, a levantar papagaio, a correr, a brincar, a passear os animais, a andar de skate, de patins, de bicicleta, triciclo ou de trotinete. Muita vida, e que bem que tudo aquilo fazia.

Mas o que começou a aparecer em maior número crescendo exponencialmente foi os praticantes de desporto, corrida e exercício físico em geral. De início uma meia-dúzia, sempre os mesmos, depois cada vez caras diferentes. Mas estes rostos traziam uma postura diferente e vestiam diferente também. Fatos mais dirigidos à prática do desporto, ao invés das clássicas t-shirts e sweat jeans. Muito compenetrados nos seus exercícios, executados com um saber que se notava vir de prática de ginásio. É mesmo verdade quando dizem que as pessoas abandonaram as mensalidades nos ginásios para passar a fazer o mesmo a custo grátis nos parques e jardins. 

Mas recentemente vi algo que achei um tanto estranho. Não foi a primeira vez que vi um personnal trainer a dar exercícios para uma pessoa os executar, mas foi a primeira vez que vi alguns acessórios de ginásio passarem a ser usados no pavimento do jardim. Entre flexões, contracções, extensões e sobre as instruções vocais do instrutor, uma pessoa fazia a sua ginástica em cima de um tapete de ginásio. 
Não é nada de muito estranho, tendo em vista que o espaço entretanto ganhou equipamento próprio para exercício, como máquina de fazer remo. E ganhou também um parque para as crianças subirem e descerem de escorrega. Mas ao mesmo tempo pareceu estar um tanto deslocado. 

Eu gosto de ir para o jardim ocasionalmente acompanhada por um livro. Gosto e não me incomodam os barulhos naturais do ar livre. Mas por alguma razão não me apeteceu sentar no único banco disponível que ali estava porque era mesmo ao lado do instrutor de fitness, que gritava: "Um, dois, três, quatro, cinco". "Agora estica a perna, isso, assim. Um, dois, três, quatro, cinco".

Sabem, é que eu nunca gostei de ginásios! Só entrar naquela atmosfera fazia-me querer sair. Máquinas todas enfiladas, pessoas mecânicas, um espaço fechado e confinado, com luz artificial mesmo de dia, semi-escuro, com ar viciado de suor e algo a tentar o disfarçar... Mil vezes o ar livre. Sempre fui assim. Então algo de estranho se deu quando vi o "ginásio" no meio do parque :) Por um acaso reparei que no outro banco uma rapariga que tentava ler um livro levantou-se nesse instante e foi embora. Terá também ela se sentido incomodada?

O espaço é grande, é livre e todos podem fazer o que quiserem. Alguns ficam na relva a relaxar, outros iniciam uma cavaqueira conversa de comadres, muitos passeiam e bicicleta, outros aproveitam e passeiam ali os cães, alguns andam alegremente soltos no espaço. Hoje vi um labrador que dava tantas voltas a todo o jardim que achei que era o melhor corredor de todos! E fazia sempre aquela rotina, parando sempre na "box" para atestar (uma poça de água). Achei-lhe muita piada. As moscas pousam em cima de tudo e é assim, maravilhoso! Normalmente vou andar ou ler para o jardim. E neste último caso prefiro a companhia do vento, dos ruídos distantes, dos pássaros e do ocasional avião que passa no céu. Vozes e conversas escuto todo o dia. Ali vou para escapar a isso, para poder estar um pouco em silêncio no meio de sons que fazem bem.


Sem comentários:

Enviar um comentário

Partilhe as suas experiências e sinta-se aliviado!